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Meio Ambiente

A vida simples do Papa Francisco e sua mensagem como líder religioso

Amanhã à meia-noite muitas famílias brasileiras estarão ligadas na Missa do Galo que será celebrada pelo Papa Francisco no Vaticano e transmitida para todo o mundo pela televisão. É um tempo de reflexão para os fieis, um tempo em que as pessoas se permitem ser mais cuidadosas com os outros humanos e a praticar caridade.
Desde 20 de dezembro, o filme “Dois Papas” dirigido por Fernando Meirelles, em cartaz na Netflix, vem acrescentando um pouco de fermento a essas reflexões, já que retrata os pensamentos do Sumo Pontífice que vem causando reações, sobretudo em líderes autoritários que não querem ouvir falar em mudanças. É um belo filme, que merece ser visto.
Assista ao teaser de ‘Dois Papas’ com Anthony Hopkins
Na visão de Fernando Meirelles, o diretor, a postura de Francisco se opõe a de Ratzinger, Bento XVI, em quase tudo. Mais dinâmico, cordial, simpático e divertido do que o alemão, o Papa argentino que já estava pronto para se aposentar e viver em qualquer pequena paróquia de seu país, foi alçado ao posto mais graduado da Igreja Católica. Sem chances de dizer “não, muito obrigado”. Na ficção com cenas reais, fica claro que Ratzinger, mesmo sendo mais sisudo, moroso, pouco chegado a novidades mundanas, simpatizou-se muito com Francisco e percebeu que ele seria importante para alavancar mudanças necessárias na Igreja Católica. Assim foi feito.
O maior desafio é tentar sair da polarização que o filme convida. E refletir sobre as mensagens que o Papa Francisco transmite com seus próprios gestos, na hora de se abster, por exemplo, de tanta pompa ao se sagrar Papa. Uma vida mais simples, é o que ele prega. Nada mais alinhado com a necessidade de se tentar travar o aquecimento global com menos consumo e produção.
Talvez seja mesmo difícil para o Sumo Pontífice transformar pensamentos em ações no seu dia a dia, cercado como está pela magnificência da sua Igreja. Talvez também esta própria dicotomia o tenha ajudado a formular pensamentos com vistas a espalhar pelo mundo a crença de que menos pode ser mais.
Houve críticas de algumas instituições ligadas à Igreja Católica ao filme. No site da Agência Católica de Informações alguns comentaristas lembraram, de maneira muito educada, que o filme reflete a ideologia do diretor e força a um pensamento fragmentado. Faz sentido. A imagem de Francisco como o Papa bonzinho, que se contrapõe à de Bento XVI, quase carrancudo, é abertamente ficcional, embora as imagens reais que aparecem de vez em quando possam conduzir o espectador a acreditar que se trata de um documentário. Não é.
Papa Francisco cumprimenta crianças antes de discurso no Vaticano neste sábado (21)
Vatican Media/Handout via REUTERS
Quero, portanto, ficar com o que, no filme, ajuda a focar nas mudanças que Francisco propõe. Porque o Sumo Pontífice, este mesmo que estará acompanhando as ceias de Natal das famílias católicas, na televisão, há seis anos vem transmitindo mensagens que interessam vivamente a pessoas que acreditam na possibilidade de mudanças de paradigma para enfrentar, entre outras coisas, as mudanças climáticas. Estou entre elas. O que mais me fascinou no filme foi esta imagem, de quem faz contato com a simplicidade da vida: cheira o manjericão, conhece a “melhor pizza do bairro” e prefere usar sapatos comuns aos impostos pela liturgia.
Em 2015, portanto dois anos depois de assumir, o Papa Francisco divulgou sua encíclica, “Laudato Si”, que deixou os ambientalistas bem impressionados. A proposta do Sumo Pontífice é clara quando convida o mundo, na Encíclica, a reduzir produção e consumo para alcançar “uma outra modalidade de progresso e desenvolvimento”. E cai como uma luva para se refletir nesta época em que as pessoas que têm recursos fazem gastos exagerados e as que não têm muitas vezes ficam deprimidas por não conseguirem.
“O ambiente humano e o ambiente natural degradam-se em conjunto; e não podemos enfrentar adequadamente a degradação ambiental, se não prestarmos atenção às causas que têm a ver com a degradação humana e social. De fato, a deterioração do meio ambiente e da sociedade afetam de modo especial os mais frágeis do planeta. Tanto a experiência comum da vida cotidiana como a investigação científica demonstram que os efeitos mais graves de todas as agressões ambientais recaem sobre as pessoas mais pobres… O impacto dos desequilíbrios atuais manifesta-se também na morte prematura de muitos pobres, nos conflitos gerados pela falta de recursos e em muitos outros problemas que não têm espaço suficiente nas agendas mundiais”, escreveu o Papa Francisco na Encíclica, uma espécie de carta endereça aos fieis da Igreja Católica.
Pois Francisco não se limitou a escrever. O Papa tem andado mundo afora e levado suas preocupações não só com o meio ambiente, as mudanças climáticas, como também com o modelo econômico vigente, que prima por acelerar a desigualdade no mundo. Em outubro deste ano, a reunião global de bispos, o Sínodo, foi sobre a Amazônia, justamente num período em que as queimadas ocupavam a atenção de todos.
O documento final do Sínodo da Amazônia, não só tocou em pontos sensíveis para a Igreja Católica, como a ordenação de homens casados e o diaconato feminino, como também chamou de pecado ecológico a política puramente extrativista que vem destruindo a maior floresta tropical do mundo e dificultando muito a vida dos quase 30 milhões de brasileiros que moram na região.
“Mais uma vez repito que convém evitar uma concepção mágica do mercado, que tende a pensar que os problemas se resolvem apenas com o crescimento dos lucros das empresas ou dos indivíduos. Será realista esperar que quem está obcecado com a maximização dos lucros se detenha a considerar os efeitos ambientais que deixará às próximas gerações?”, pergunta-se o Papa Francisco em sua Encíclica.
Papa Francisco com participantes do Sínodo dos Bispos sobre a Amazônia, em outubro de 2019
Remo Casilli/Reuters
Não contente, o Sumo Pontífice da Igreja Católica está, neste instante, organizando um evento intitulado “Economia de Francesco” , que vai acontecer na cidade italiana de Assis, de 26 a 28 de março do ano que vem.
A carta-convite, assinada em maio de 2019 por Francisco, é endereçada, mais especificamente, aos jovens: “Sim, precisamos encorajar a economia… Suas universidades, suas empresas e suas organizações são esperança para construir outras formas de entender a economia e o progresso, combater a cultura do descarte, dar voz àqueles que não o têm, propor novos estilos de vida. Enquanto nosso sistema econômico e social produzir apenas uma vítima e houver apenas uma pessoa descartada, não haverá partido de fraternidade universal”.
Trata-se, no fim e ao cabo, de um líder que fala a mais de um bilhão de pessoas palavras que, se ouvidas, podem dar um novo rumo ao mundo.
Boa noite de Natal a todos vocês.

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