Meio Ambiente

No ‘novo anormal’ em que estamos vivendo, é preciso criar soluções

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E as soluções? De onde virão?
Amigos com quem encontro e me permitem uma conversa sobre os rumos do mundo costumam se despedir de mim com estas perguntas. Os problemas estão aí, me dizem. Os sites de notícia não se cansam de mostrá-los, e vamos ficando sem jeito, às vezes sem esperança, às vezes furiosos, às vezes com expectativa de que alguma coisa vai acontecer, de uma hora para outra, uma espécie de mão invisível (não a do mercado) que vai estancar o movimento bélico de Donald Trump, que vai agitar menos os ventos na Austrália para ajudar a acabar com o fogo, que vai parar a chuva na Indonésia, o desmatamento na Amazônia, a desigualdade no mundo.
Não é assim, claro. Até porque não existe uma única solução, mas várias. Não votar em pessoas que claramente demonstram pouca disposição em manter o bem-estar das pessoas e muita garra para a luta e para permanecer no poder, pode ajudar. O que mais depende do cidadão comum? Há pessoas pensando a respeito, e não são poucas.
A deputada Alexandria Ocasio-Cortez, de Nova York, e o senador Edward J. Markey, de Massachusetts, nos Estados Unidos, ambos do Partido Democrata, sentaram-se sobre estudos e alinhavaram uma proposta que tem chamado a atenção e ganhado adeptos em alguns estados norte-americanos. Chama-se “Green New Deal” e pede ao governo federal que retire os Estados Unidos da dependência dos combustíveis fósseis para reduzir as emissões de gases de efeito estufa que causam o aquecimento global. Mas, não só: o estudo visa também a garantir novos empregos bem remunerados nas indústrias de energia limpa.
A proposta ainda terá que ser submetida ao Senado para virar lei, mas a marcha neste sentido já começou. No twitter, ontem mesmo, Ocasio-Cortez lembrava, com base nas manifestações atuais, que a mobilização está aumentando:
“A questão é: vamos nos mobilizar reativamente para a destruição ou vamos agir proativamente para a prevenção?”, perguntou-se ela.
A Califórnia, um estado bastante ativo na luta contra o aquecimento global, e importante para a votação, se pronunciou na segunda-feira (6). Legisladores estaduais liberais divulgaram novos objetivos do Green New Deal, incluindo reduzir a falta de moradia (a Califórnia tem 47% de toda a população sem teto dos Estados Unidos, que hoje registra mais de meio milhão de pessoas), reduzir as emissões de gases de efeito estufa e melhorar o padrão de vida das comunidades pobres dentro de dez anos. O projeto ainda não inclui detalhes específicos sobre como eles querem que o Estado atinja essas metas.
Neste sentido, outra parlamentar, a jovem primeira-ministra da Finlândia , Sanna Marin, tem ideias que podem ajudar. O país que ajuda a administrar sempre adotou horários flexíveis de trabalho, tem uma taxa de desemprego de 6,7%, mas Sanna Marin aumentou esta aposta. Ela propõe colocar o país inteiro em uma semana de trabalho de quatro dias ou seis horas de trabalho.
O que isto tem a ver diretamente com a mudança de paradigmas que se quer para tentar travar a corrida do aquecimento global? Muita coisa.
Se o cidadão trabalhar menos (com o salário de sempre, claro), terá mais tempo livre para cuidar de si, da família, rever a alimentação, estudar, tornar-se mais informado, até mesmo, sobre as questões climáticas. E vai abrir espaço para outros, diminuindo a taxa de desemprego, proporcionando a outras pessoas uma elevação de seu patamar de bem-estar.
S. Marin não está sozinha na percepção de que se as pessoas se entregarem menos ao trabalho as coisas podem melhorar bastante para todos. O país vizinho à Finândia, Suécia, há alguns anos testou o dia de seis horas de trabalho, em vez de oito. O Partido Trabalhista do Reino Unido tem também a ideia de instalar, quando estiver no governo, a semana de trabalho de 32 horas. Na França, desde 2000 a semana de trabalho tem 35 horas e a taxa de desemprego é de 8,5%. Alta se comparada aos Estados Unidos (3.6%) e baixa se comparada aos 11.8% no Brasil.
Um dos homens mais ricos do mundo (está em oitavo lugar, na última classificação da revista “Forbes”), o mexicano Carlos Slim já declarou algumas vezes sua percepção de que as semanas de trabalho mais curtas são uma solução para as mudanças na civilização necessárias. Segundo ele, historicamente, quanto mais a tecnologia avança e mais progresso há, menos se necessitará dos humanos para o trabalho. Ao mesmo tempo, as pessoas vivem mais, com saúde melhor, o que faz da nossa civilização um momento em que se precisa mais conhecimento e experiência do que esforço físico.
“De fato, começamos isso na Telmex – unidade fixa da América Móvil, empresa de Slim – há alguns anos. Estamos oferecendo às pessoas que têm muito conhecimento para ficar mais tempo e trabalhar menos dias. Nas indústrias em que há muito pessoal, como agências governamentais, em vez de cortar pessoal, você pode entrar em um esquema como este, onde pode ter mais pessoas, talvez pagar mais salários”, disse Slim em entrevista ao site da Bloomberg Businessweek.
Ganhar menos horas de trabalho sem perda de salário pode parecer um sonho e, aqui para o Brasil, ainda distante. Mas a ideia também está sendo levada adiante pelo pessoal da New Economics Foundation, organização que reúne pensadores com propostas sobre as mudanças civilizatórias necessárias.
“Hoje, os argumentos em torno da redução do tempo de trabalho estão voltando. A automação injetou o debate com uma nova urgência”, escrevem em seu site, dando início à campanha com a nova proposta.
Num momento em que o mundo está vivendo a tensão de uma possibilidade de guerra, inclusive com a ameaça de que o Irã abandone o acordo nuclear, pode parecer inútil pensarmos em respostas que estão na base dos problemas. Mas o caminho é criar soluções, se quisermos sair da enrascada em que os líderes, supostamente vivendo sob regime democrático, decidem nos meter.
E aqui vale lembrar: daqui uns dias saberemos o veredicto do Boletim de Cientistas Atômicos, que anualmente declaram ao mundo quanto tempo falta para chegarmos ao fim. Com a atual situação, a cientista Rachel Bronson declara, no site da instituição, que estamos vivendo “um novo anormal”, um momento em que o fato real não está distante da ficção. Está na hora de levantar da poltrona, guardar o controle remoto, e sair para a ação real.