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'Cerrado também dá açaí, é só cuidar', diz agricultora responsável por produção no DF

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Aida cuida de 2,5 hectares de açaizeiros na região rural da Fercal. Ela vende 1kg da polpa do açaí por R$ 35 . Aida segurando o açaí e no fundo sua plantação de açaí.
Milena Castro/ G1DF
Quem olha a foto acima, pode até dizer que a agricultora Aida Kanako Ashiuchi Cardoso segura um punhado de jabuticabas nas mãos. Isso acontece pela cor e pelo formato do fruto.
Mas, na verdade, Aida é responsável pelo plantio de açaí no Distrito Federal. Uma cultura incomum no centro-oeste do Brasil, visto que a terra é mais seca e menos nutritiva em comparação ao Norte.
“O cerrado também produz açaí. É só cuidar.”
A agrônoma é responsável pela produção de 2,5 hectares de açaizeiros na região rural da Fercal. Ela participa de todas as etapas do processo de produção: do plantio à venda.
Do Pará para Brasília
Aida morou três anos no Pará e conta que, quando voltou para Brasília, encontrava apenas as versões industrializadas do produto. “Era uma espécie de sorvetinho que virava água depois de derretido”, relembra.
Ela diz que a vontade de plantar açaí cresceu depois que os filhos começaram a consumir a fruta. A mãe queria que eles conhecessem o “açaí de verdade”.
“Eu dizia, isso não é açaí não. Deixa que a mãe vai plantar para tirar a polpa pra vocês, pra tomarem um açaí de verdade.”
Aida segurando um cacho de açaí. No fundo esquerdo os açaizeiros, enquanto no lado direito tem um curral de gado.
Milena Castro/ G1DF
Em 2007, ela começou a plantar em um terreno maior. Após cinco anos os pés começaram a dar frutos.
Aida esperou, sem pressa. Hoje, participa de todas as etapas do processo de produção: do plantio à venda.
O G1 fez um levantamento e encontrou no DF apenas produtores com plantações pequenas, tendo um ou dois açaizeiros, ou pessoas que ainda estão no início da produção – com, no máximo, 100 mudas com menos de três anos. Aida foi a única produtora com mais de um hectare plantado no Cerrado.
Aos 65 anos, a agrônoma faz parte dos 38% de mulheres produtoras rurais cadastrados na Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater) do Distrito Federal.
Reportagens especiais
A história da paulista Aida Kanako Ashiuchi Cardoso, descendente de japoneses e brasiliense de coração é a sexta reportagem especial do G1 em homenagem ao Dia Internacional da Mulher, celebrado no último domingo (8).
O objetivo é dar visibilidade a temas e exemplos que cercam a temática feminina. Nesta quinta-feira (12), o foco são as mulheres pequenas agricultoras. Confira as outras reportagens da série:
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Plantação de açaí
Antes mesmo de conseguir plantar o açaí, Aida teve que enfrentar um longo processo de convencimento do marido. Ela contou à reportagem que já tinha mais de uma década que eles eram proprietários da chácara de 114 hectares, no entanto, o objetivo do esposo era a criação de gado.
Ela começou plantando umas poucas mudas, enviadas por uma amiga do Pará. “Pra ter certeza que era possível”, lembra.
O local escolhido para plantar era perto de um pequena vala com água. “Era preciso garantir a umidade”, diz ela.
“Logo virou uma touceira e começou a dar aqueles cachos. E eu falando pro meu marido: esse negócio dá aqui, é só dar água.”
Após muita insistência, Aida conseguiu convencer o esposo, que cedeu um pedaço da chácara para que ela plantasse. Ela lembra que o lugar só tinhas cascalho e que, por isso brincou: “Isso é um desafio. Ele tá me desafiando, que desaforo.”
Assim, a mulher decidiu chamar um trator, revirou os cascalhos, preparou a terra e instalou um sistema de irrigação. Fez as covas para plantar e também selecionou quais cachos seriam usados para fazer as mudas.
De lá para cá, a plantação não só cresceu e deu muitos frutos, como o marido passou a incentivar o trabalho de Aida, que agora pretende plantar um novo tipo de açaí, batizado de BRA Pai d’Égua. “Ele é resultado de uma seleção da Embrapa do Pará”, conta a agrônoma.
Os pesquisadores afirmam que, no Norte do país, a fruta pode ser produzida durante o ano todo. Aida diz estar curiosa para saber se o mesmo acontece no Cerrado.
Mudas de açaí Pai d’Égua dentro de uma estufa sendo irrigadas.
Milena Castro/ G1DF
Diferenças entre o Norte e o Centro-oeste
A agrônoma Aida Kanako Ashiuchi Cardoso explica que a etapa de extração é um dos processos que mais diferencia a produção de açaí no Norte e no Distrito Federal. O clima brasiliense é mais seco e como o fruto precisa de muita água – desde a plantação até o momento de extração da polpa – quanto menor a quantidade de água no solo, maior o tempo de molho.
Para driblar o solo seco, ela investiu em um sistema irrigação que traz água por gravidade dos morros próximos e, quando necessário, a plantação é irrigada com a água de um poço artesiano. A produtora também usa fertilizantes para enriquecer os nutrientes da terra.
Entenda o processo de extração da polpa
Primeiro o fruto é colocado em um catador onde são eliminados insetos e sujeira superficiais;
Depois, o açaí fica de molho no cloro;
Em seguida é enxaguado até tirar todo cloro;
Mais tarde o açaí é colocado de molho em uma água a 85°C;
Por fim, ele é despejado na chamada “despolpadeira” – uma máquina para extrair a polpa.
Após todo esse processo, Aida embala e pesa cada embalagem, que é certificada e congelada. Elas tem 1kg e cada uma é vendida por cerca de R$ 35.
Feira Rural do Parque
No último final de semana, pela primeira vez a produtora participou da Feira Rural do Parque, promovida pela Emater-DF. O evento foi no estacionamento 13 do Parque da Cidade.
Para Aida, o objetivo não foi vender, e sim “divulgar o produto para os diversos frequentadores do Parque”.
Aida entregando um saco com dois pacotes de polpa de açaí para uma compradora na Feira Rural no Parque, em Brasília.
Milena Castro/ G1DF
Benefícios do açaí
O professor da Universidade Federal do Pará e diretor geral do Centro de Valorização de Compostos Bioativos da Amazônia (CVACBA) Hervé Rogez, cita os principais benefícios do açaí. Segundo ele, o fruto reúne o tripé da dieta mediterrânea – azeite de oliva, fibras e antioxidantes.
Ele afirma que a incidência de doenças cardiovasculares e de câncer é menor na população que tem uma alimentação rica nesses produtos. O açaí, tipicamente brasileiro, é “três em um”.
“O óleo presente no açaí, que é o caráter cremoso dele, tem a mesma composição do azeite de oliva, ele também tem muita fibra e é uma bomba em antioxidante.”
*Sob supervisão de Maria Helena Martinho.
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