Subsecretário-geral Tom Fletcher afirma que impedimento à entrada de alimentos pode configurar crime de guerra
O subsecretário-geral de ajuda humanitária da ONU, Tom Fletcher, afirmou em entrevista à BBC que Israel está submetendo a população da Faixa de Gaza à “fome forçada”, bloqueando a entrada de ajuda humanitária. Segundo ele, a conduta israelense pode ser classificada como crime de guerra.
“Estamos vendo alimentos sendo deixados nas fronteiras e não sendo autorizados a entrar, enquanto há uma população do outro lado passando fome. Isso, claramente, se encaixa na definição de crime de guerra. Mas caberá à Justiça e à História julgar”, afirmou Fletcher.
O alerta do alto funcionário da ONU ocorre em meio a uma crise humanitária que se intensificou após o bloqueio israelense de quase três meses, que impediu o acesso a alimentos, medicamentos, combustível e abrigo. Embora Israel tenha começado a permitir a entrada limitada de ajuda na semana passada, o subsecretário criticou a lentidão e o controle rígido sobre os envios.
Fletcher também cobrou publicamente o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu por não repudiar declarações de ministros de seu governo, como a do ministro das Finanças, Bezalel Smotrich, que sugeriu que os palestinos deveriam “buscar uma nova vida em outros países”.
“Essa política de deslocamento forçado precisa ser totalmente rejeitada. Esperamos que governos em todo o mundo defendam o direito humanitário internacional”, enfatizou.
Críticas à condução da guerra
A condução da ofensiva militar israelense em Gaza tem gerado críticas crescentes da comunidade internacional. Líderes da União Europeia, Reino Unido, França e Canadá pediram a interrupção das operações militares e o livre acesso da ajuda humanitária. Em resposta, Netanyahu acusou os líderes ocidentais de estarem “do lado do Hamas”.
O próprio chanceler alemão, Friedrich Merz, declarou recentemente “não entender mais os objetivos de Israel”, e a chefe da diplomacia da UE, Kaja Kallas, afirmou que os ataques israelenses “vão além do necessário para combater o Hamas”.
Acusações de exagero e resposta de Fletcher
Fletcher enfrentou críticas após declarar que 14 mil bebês poderiam morrer em 48 horas se a ajuda não fosse liberada. A afirmação foi posteriormente corrigida pela ONU. Em entrevista, ele admitiu a necessidade de linguagem precisa, mas manteve o tom de urgência: “Estávamos desesperados para conseguir a entrada da ajuda. Meu trabalho é salvar vidas, e vou continuar falando”.
Israel também rebateu a alegação de que milhares de caminhões estariam retidos na fronteira, acusando Fletcher de divulgar informações imprecisas. O Ministério das Relações Exteriores israelense o acusou de ignorar os crimes cometidos pelo Hamas e de repetir sua propaganda.
O subsecretário da ONU, por sua vez, reafirmou que a ajuda precisa chegar exclusivamente aos civis, e rejeitou alegações de que o Hamas estaria desviando grandes quantidades de alimentos. “Não queremos que nenhum recurso chegue ao Hamas. Nosso foco é a neutralidade, a imparcialidade e salvar vidas civis”, explicou.
Situação em Gaza e apelo por mediação
Fletcher também reiterou que a única saída possível para o conflito é a mediação e a negociação, pedindo a libertação imediata dos reféns israelenses ainda em poder do Hamas. No entanto, ele questionou os rumos da guerra: “Não sei mais qual é o objetivo. Fala-se muito em acabar com o Hamas, mas é evidente que os ataques foram além disso”.
Segundo o Ministério da Saúde de Gaza, mais de 54 mil pessoas foram mortas no território desde o início da ofensiva israelense, em outubro de 2023, após o ataque do Hamas que matou cerca de 1,2 mil pessoas e fez 251 reféns.
Fletcher concluiu com um apelo ao Conselho de Segurança da ONU, afirmando que o mundo já falhou em genocídios anteriores, como os de Ruanda e Srebrenica. “Estamos diante de um momento decisivo. Vamos agir agora ou mais uma vez lamentaremos depois?”
Voz de Brasília
Fonte: Correio Braziliense
Foto: foto da web
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