Economia

Gente do campo: família Potter planta uvas no Sul e é pioneira no uso de energia solar em vinícola

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Guatambu foi a 1ª da América Latina a apostar em placas solares e vai ampliar o investimento. Neto de imigrantes alemães, Valter Potter lidera estância ao lado da mulher e das filhas. Família Potter planta uvas no Sul e é pioneira no uso de energia solar em vinícola
“Tu é prima do Harry?” Mariana passou a adolescência ouvindo esta pergunta. O sobrenome alemão, que acabou famoso pela série de livros inglesa, chegou ao Brasil bem antes, em 1860, com os bisavós dela, imigrantes que se estabeleceram no Rio Grande do Sul.
A família Potter brasileira (se escreve Pötter e se diz “Pêter”, mas a nova geração já assumiu a pronúncia famosa) hoje vive em Dom Pedrito, perto da fronteira com o Uruguai.
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Ela se dedica à agropecuária e, mais recentemente, a uma “vinícola boutique” que produz em pequena escala e foi a primeira na América Latina a funcionar com energia solar.
As placas (à esq) instaladas na Guatambu permitem que a vinícola funcione só com energia solar.
Rodrigo Alves Vieira
A Guatambu – nome de árvore – foi criada pelo pai de Mariana, Valter, após ser “provocado” pela irmã dela, Gabriela, em 2003.
O investimento em energia solar começou em 2016, com as primeiras 600 placas fotovoltaicas, suficientes para a vinícola, que requer muita energia para conservar temperaturas frias.
“A economia na conta (de luz) fica entre 80% e 85%”, diz o produtor.
O gasto inicial foi de R$ 1,3 milhão, que tem previsão de retorno em 6 anos e meio.
O parque já foi aumentado para 800 placas, que permitem que a energia solar seja usada também em outras partes da estância, como silos. Em breve, elas chegarão a 1 mil e a meta é que todo o empreendimento da família, que inclui pecuária e agricultura, seja autossuficiente.
Sustentabilidade
O proprietário conta que a iniciativa na vinícola da Guatambu inspirou outras fazendas. “No início (outros proprietários da região) acharam que seria algo fora de contexto”, diz. “Hoje já tem umas 108 casas, 7 a 8 fazendas (com painéis solares, na região). Também prédios comerciais, engenho de arroz, e mesmo um hospital a Santa Casa, de São Gabriel.”
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Valter, de 72 anos, é veterinário e a pecuária e a agricultura são as atividades principais na estância, que já foi mostrada em reportagem do Globo Rural sobre os pampas, em 2018.
Os vinhedos são livres de agrotóxicos. Ele afirma que ainda não foi possível abrir mão totalmente do uso de pesticidas em todas as culturas da família porque ainda é necessário o herbicida dessecante para se fazer o plantio direto.
Gado é criado sem confinamento na estância dos Pötter
Divulgação
Foram adotadas medidas para que a produção seja o mais sustentável possível. Entre elas, a rotação de culturas, “cobertura verde” no inverno, uso de pesticidas biológicos e a criação de gado solto, com suplementação na época de muita geada.
Os parreirais ficam em uma fazenda de área natural, sem agricultura. “Ali tem a maior reserva de pássaros campestres nativos do Rio Grande do Sul”, conta Pötter, explicando que o local foi assim reconhecido pela ONG BirdLife. “20% (da estância) é reserva legal, já faz mais de 20 anos”, destaca o proprietário.
A estância Guatambu nos anos 70
Arquivo pessoal
Da psicologia ao campo
A filha Mariana, de 36 anos, tinha decido não seguir os passos do pai. Apesar de ter sido criada na estância e ter escolhido veterinária como carreira no primeiro vestibular, no qual não passou, preferiu a psicologia. Se especializou em terapia e teve clínica por 9 anos.
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Arquivo pessoal
“Eu ia uma vez por semana para a fazenda porque eu era responsável pelo recrutamento, as atividades de RH”, conta. Mas o crescimento dos negócios da família acabou levando a psicóloga de volta às origens. Hoje ela cuida do marketing e dos eventos da estância, que promovia o turismo até a chegada da pandemia.
“Me sinto muito realizada. Adoro trabalho em equipe, a gente está crescendo, se profissionalizando”, diz Mariana. “Coordeno a parte turística da vinícola e isso não foge do meu propósito de antes, que é bem estar, proporcionar experiências agradáveis para as pessoas.”
Vendas em alta na pandemia
A pandemia desafiou a empresa, impedindo os eventos. O momento de pausa também gerou ideias. Os Potter viram as vendas de seus vinhos e espumantes aumentarem e a Guatambu decidiu lançar em breve seu e-commerce próprio.
A vinícola produz 8 variedades de uvas (chardonnay, sauvignon blanc, gewürztraminer, tempranillo, merlot, tannat, cabernet sauvignon e pinot noir) e atualmente tem 26 rótulos, entre vinhos tintos, brancos, um rosé e espumantes, além de sucos. Os nomes homenageiam a região, como “Luar do pampa”´.
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Negócio de família
“Me traz muitas recompensas trabalhar em família, unindo os talentos de cada um”, diz a filha Gabriela, de 41 anos. A agrônoma também integra o time de enólogos da empresa dos Potter.
Gabriela foi quem convenceu Valter a inclui mais um cultivo no negócio, o de uvas
Divulgação
E existe conflito de gerações? “Sei, certamente, o dia que eu posso e o dia que não posso (falar sobre alguma coisa). Brincadeiras à parte, é muito interessante que (o pai) foi se abrindo cada vez mais para nossas ideias. A vinícola é supermoderna”, conta Mariana. “Basta ter argumentos. Quando é uma questão congruente, ele sempre é a favor.”
Para Valter, o negócio de família é um diferencial: “São muitos processos, é muito complexo e há necessidade de muita capacitação, de conhecimento e de amor ao negócio.”
“Só é possível desenvolver essa diversificação com bastante eficiência, com a família trabalhando junto”, reconhece.
Espumantes estocados em cave da Guatambu
Divulgação
Erica e Walter Germano Pötter, os pais de Valter: filhos de imigrantes alemães que vieram para o Brasil no século 19
Arquivo pessoal
A Guatambu cultiva oito variedades de uvas, incluindo a tannat
Divulgação
Agrônoma, Gabriela Pötter (à esq) faz parte do time de enólogos da vinícola
Divulgação
Família Pötter gosta de celebrar a cultura do pampa
Caroline Duarte
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