Meio Ambiente

França poderá ter dois meses de ondas de calor por ano em 2100, diz relatório

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As previsões mais pessimistas apontam que alta média nas próximas décadas será de 3,9˚C, e não de cerca de 1,5˚C, como prega o Acordo do Clima de Paris. Um homem com uma garrafa d’água passa por uma mulher tomando uma bebida em uma ponte sobre o rio Sena, em frente à Torre Eiffel, em Paris, na França. Parisienses se preparam para o aumento da temperatura na capital francesa com a chegada de uma nova onda de calor no norte da Europa que pode bater recordes em vários países
Philippe Lopez/AFP
Um novo relatório de meteorologistas e climatologistas do instituto Météo France traz previsões preocupantes sobre o aquecimento do planeta. O estudo indica que, se as emissões de gases de efeito estufa não tiverem uma queda drástica, a França terá de 20 a 35 dias de ondas de calor por ano no fim do século, podendo chegar a 60 dias no sul do país, com temperaturas que deverão atingir 50˚C.
As previsões mais pessimistas apontam que alta média dos termômetros será de 3,9˚C, e não no máximo 1,5˚C, como prega o Acordo do Clima de Paris, orientado pelas previsões de cientistas do Painel da ONU para Mudanças Climáticas. No verão francês, o aumento chegaria a 6˚C, o que resultaria em dias e noites dificilmente suportáveis. Nesta situação extrema, o acúmulo de neve passaria a ser raro no país, visível apenas em cidades montanhosas, a mais de 1,5 mil metros de altitude.
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“Os primeiros resultados indicam que, até a metade do século, não há mais o que fazer, devido à inércia do mecanismo climático, e esperamos um aquecimento de 2,2˚C em média, na França”, explica o  diretor de climatologia do instituto, Patrick Josse. “Por outro lado, até o fim do século, as decisões que tomamos hoje poderão fazer a diferença. Elas podem nos levar a futuros diferentes, até mesmo muito diferentes.”
Os cientistas elaboraram três cenários: no otimista, os países realizam esforços à altura do problema e o mundo atinge a neutralidade de carbono em 2070; no segundo, há uma redução da taxa de emissões somente a partir de 2050. No terceiro e pior, os índices seguem em elevação, como atualmente.
As previsões de altas de temperatura se referem aos registros de 1976 e 2005, quando os valores já eram considerados elevados em relação à era pré-industrial. “No cenário em que teremos ações climáticas voluntárias, podemos manter esse aquecimento, de cerca de 2˚C, mas no cenário mais pessimista, com fortes emissões de CO2, teremos o dobro do aquecimento, em torno de 4˚C. Essa evolução das temperaturas será representada e ilustrada por fenômenos extremos, principalmente ondas de calor”, indica o climatologista. “Até no cenário otimista, teremos um leve aumento da frequência de ondas de calor. Mas no pessimista, elas durarão de cinco a 10 vezes a mais, no fim do século.”
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Esforço global para evitar o pior
Tudo vai depender, portanto, do quanto os países –não apenas a França – estarão dispostos a cumprir os compromissos para frear drasticamente as emissões no planeta a partir da segunda metade do século. O esforço precisa ser coletivo para dar resultados e evitar o pior – previsto no caso de as emissões seguirem em alta contínua.
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Os maiores poluidores do planeta são a China, que desponta à frente, seguida pelos Estados Unidos e, mais atrás, Índia, Rússia e Japão. A União Europeia caminha no bom sentido: no ano passado, pela primeira vez, a produção de energia no bloco por fontes renováveis ultrapassou as fósseis, como carvão e gás. Uma análise do think tank de energia e meio ambiente Emper, que compilou os dados, aponta que a pandemia colaborou para esse resultado, ao levar à queda da demanda energética. Mas a tendência de inversão da curva se confirma independentemente das paralisações geradas pelo coronavírus.
O passo é crucial para o bloco atingir a neutralidade de carbono em 2050, como promete. Para chegar a esse objetivo, será necessário acabar com as energias de fontes fósseis – uma meta ainda utópica.
“É preciso substituir o carvão e o gás, mas ainda temos muito dos dois. Acho que, em 2050, ainda precisamos de um pouco das fósseis, além de uma outra energia descarbonizada, a nuclear”, avalia o professor emérito da Universidade de Montpellier e diretor do Centro de Pesquisas em Economia e Energia (Creden), Jacques Percebois. 
“Na União Europeia, não poderemos ter 100% da energia de fontes renováveis em 2050. Isso não me parece muito realista, inclusive nos cenários mais otimistas”, diz o professor.
Energia nuclear complementada com renováveis
A França ainda avança a passos lentos na produção energética de fontes renováveis, como eólica e solar. Mas o país está entre os bons alunos do bloco, ao depender majoritariamente da energia nuclear.
Estas usinas emitem pouco CO2, embora resultem em dejetos nocivos ao meio ambiente. É por isso que países fortemente dependentes do carvão, como a Polônia, apostam na construção de centrais nucleares para atingir suas metas de emissões de gases que provocam o efeito estufa.
“A França é um país relativamente esforçado. Se comparamos as emissões de CO2 da França com as da Alemanha, para pegar um país vizinho, a França é esforçada, assim como a Suécia. Os que ainda não são exemplos nesse sentido, por terem muitas usinas a carvão, como a Alemanha, precisam contar com as importações dos países vizinhos”, afirma o especialista. “A Dinamarca é um bom exemplo: ela desenvolveu bastante as renováveis, mas em alguns momentos do dia ela é obrigada a importar porque não tem energia suficiente.”
O estudo do Emper apontou que as fontes renováveis representaram 38% da matriz energética europeia em 2020, graças a uma alta de 9% da produção de eólicas e 15% da solar. Para o restante, 37% é de origem fóssil e os demais 25%, nuclear.
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